“OS PRECONCEITOS, MEU AMIGO, SÃO OS REIS DO VULGO.” (Voltaire).

19/11/2010 at 7:28 7 comentários

Assisti estarrecido o vídeo postado no blog Unaí Para Todos, em que o jornalista Luiz Carlos Prates, da RBS de Santa Catarina, ao discorrer sobre o balanço do trânsito no último feriado, tece comentários preconceituosos sobre os pobres que agora, graças ao crédito fácil promovido pelo “espúrio” Governo Lula, têm o direito de comprar carros sem nunca terem lido um livro sequer. (Para quem não viu o vídeo, disponibilizo-o ao final deste artigo).

De início, não acreditei no que via: a mais solene e clara manifestação preconceituosa que ouvi nos últimos dias, que chega às casas dos cidadãos através de uma rede de televisão, que é uma concessão pública, ou seja, um bem de toda a sociedade.

Desde a última eleição, esse tipo de comentário brota aqui e ali: Mayara Petruso, no Twitter, incitando a violência contra nordestinos; a descoberta de núcleo nazifacista em Porto Alegre; e jovens de classe média agredindo pessoas por motivos homofóbicos.

Antes se dizia que não éramos um país preconceituoso, mas hoje se descobre, graças à grande mobilidade social ocorrida nos últimos anos, que a discriminação, especialmente a de classe, sempre esteve latente entre nós, escondida nos subterrâneos, e não aflorava porque a classe dominante não se sentia realmente ameaçada.

As infelizes declarações do jornalista não deveriam merecer, por si só, tanta tinta. Mas não posso deixar de notar que os acidentes de trânsito, na sua tosca visão, são provocados pelos pobres que agora têm carros. Deduzo, portanto, que rico não se envolve em acidentes de trânsito e respeita fervorosamente a legislação, inclusive porque tem o saudável hábito da leitura.

Daí porque as causas da violência no trânsito no Brasil decorrem do fato de as pessoas de baixa renda comprarem carro, sobretudo carros populares. Você, que não é rico, e que comprou um carro 1.0 ou equivalente nos últimos anos, é o grande vilão das estatísticas.

A julgar pelas manifestações do tal Luiz Carlos Prates, o caos do trânsito brasileiro se deve a essa inclusão social. Resolve-se, então, o problema simplesmente impedindo que pobres iletrados comprem carro. Que andem a pé, de ônibus, de bicicleta, de charrete, mas não de carro. É simples assim.

Também me chamou a atenção o adjetivo dado ao atual governo, chamado de espúrio (ou seja, não genuíno, ilegítimo, falso) justamente por dar aos menos favorecidos as mesmas oportunidades que este país sempre conferiu à sua elite. Um governo que inclui os cidadãos, que lhes dá acesso a bens de consumo, a serviços públicos essenciais, como energia elétrica, à possibilidade de acesso à educação através de instrumentos como PROUNI e ENEM e a emprego e renda é epitetado como um governo adulterado.

E é adulterado, segundo esse distorcido ponto de vista, porque vai na contramão de todos os governos que tivemos até então, que não se preocuparam em garantir ao brasileiro o acesso pleno aos direitos que a cidadania lhes confere. É um governo ilegítimo por contrariar os interesses dos ricos, dos poderosos, da elite dominante, da Casa Grande, fazendo ascender a Senzala.

Por último, devemos refletir que o referido “jornalista”, para expressar a sua opinião discriminatória, se valeu de uma concessão pública, ou seja, de um serviço pertencente à sociedade brasileira. Foi por meio da televisão que destilou o seu ódio, não se preocupando com o interesse social e com o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, que os meios de comunicação estão obrigados a proteger e a cultivar.

E quando alguém fala em regulamentar os arts. 221 e 222 da Constituição da República, através da chamada “Ley de Medios”, a imprensa deita e rola, acusando o governo de solapar a liberdade de expressão, como se a mídia pairasse sobre o bem e o mal, sobre tudo e sobre todos, livre de qualquer regulação legal que a impeça ou a inibia da prática de atos flagrantemente contrários aos interesses da coletividade.

Lastimável. Terrível. Lamentável. Hororroso. Sem resvalar também em algum tipo de preconceito, encerro constatando que a região sul, especialmente os Estados de Santa Catarina e Paraná, se notabiliza pelo domínio político da direita brasileira. São estados conservadores em que grande parte da população tem tendência à discriminação em todos os matizes. É campo fértil para o crescimento do ódio e do preconceito.

E já que o título deste artigo é uma citação, fecho com outra: “Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito.” (Albert Einstein).


Entry filed under: Notícias e política.

AFORA SÃO PAULO E RIO DE JANEIRO, O RESTO É PERIFERIA CLUBE DO LIVRO. O QUE ACHAM?

7 Comentários Add your own

  • 1. teste  |  19/11/2010 às 16:27

    Veja a notícia no site PortalUnai a respeito do IPTU: http://www.portalunai.com.br/conteudo/ler_cont.php?id=514

    Quem lê sem conhecer a verdadeira história, acha que o Prefeito é um Santo.
    Esse site na minha opinião é muito sem vergonha.

    Responder
    • 2. Paulo Gilberto Alves de Sousa  |  21/11/2010 às 17:04

      Infelizmente, meu amigo Teste, não apenas o site Portal Unaí, mas muitos outros, que vivem às custas de convênios ou contratos com a Prefeitura. Em geral, são veículos oficiais de divulgação dos atos da Prefeitura. Lembra o debate que tivemos sobre diário oficial e publicação de atos da Administração? Pois é, eu sou obrigado a admitir que em Unaí nós termos vários órgãos oficiais de divulgação, impressos, televisivos e radio transmitidos. Mesmo assim, espero concluir daqui a alguns dias a minuta do projeto de lei. Não sei é se conseguiremos aprovar uma proposição assim na Câmara Municipal.

      Responder
      • 3. teste  |  21/11/2010 às 19:07

        É, esse tipo de divulgação que só existe uma verdade, (que é a que eles desejam transmitir), definitivamente não me interessa.
        Eu estou muito ansioso para ver a minuta e sugerir pontos que acho essencial. Por que vc acha que o projeto não seria aprovado pela Câmara? Existem mais Vereadores da situação?
        Vc acha então melhor tentar propor através de Iniciativa Popular? (Haveria mais pressão pela aprovação)
        Caso escolha a Iniciativa Popular, seria interessante fazer palestras em Faculdades, Escolas, enfim, para explicar como funciona essa questão na cidade e como seria a forma ideal.
        Mas penso que algo assim, precisaria de uma entidade com participação da sociedade organizada, professores, enfim, para conscientizar principalmente a juventude.

      • 4. teste  |  21/11/2010 às 19:36

        Esses portais na Internet que existem em Unaí, geralmente só copiam o que é postado nos sites oficiais, não permitem comentários dos internautas, logo, não contribuem em nada para a sociedade. Só servem aos interesses de pessoas que desejam transmitir status perante ao resto da população, omitindo os assuntos que realmente são de interesse público.
        (Não lembro quem disse: Pior do que a censura, é a omissão) e eu concordo.
        Agora, é óbvio que os sites existentes na cidade são sites de divulgação. Me parece que pagando, eles divulgam o que vc desejar, não importando se é a verdade verdadeira ou não.
        O que é preciso ter, e me parece que agora está vingando, são as fontes alternativas de notícias, com diferentes pontos de vista, para que a população possa decidir qual acha ser a verdade a ser considerada. Os blogs tem mostrado sua necessidade e importância.

  • 5. Geni de Sousa  |  19/11/2010 às 16:42

    Paulo, precisamos de algo mais concreto em Unaí. Precisamos de formarmos um grupo de estudos municipal, reunirmos periodicamente, um grupo suprapartidário. Sem alarde, te peço que escreva em seu Blog na segunda, vou sugerir também ao Zé Antônio e eu farei o mesmo na segunda. Vamos fazer de conta que foi uma “geração espontânea”.

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  • 6. José Luiz  |  19/11/2010 às 16:51

    Total liberdade de expressão é isso, poder manifestar preconceito de classe ao vivo e, inclusive, através dos meios públicos de comunicação.

    Já a lei dos meios de comunicação é realmente necessária, não para impedir a destilação do ódio, mas para evitar o monopólio e permitir/garantir que a liberdade de expressão tenha inúmeros veículos para facilitar a livre manifestação do pensamento a todas as classes sociais.

    A grande mídia do Brasil não quer essa regulação, e, se pudesse, revogava até o 9º mandamento, para levantar falsos testemunhos ao seu bel prazer.

    Responder
  • 7. Paulo Gilberto Alves de Sousa  |  19/11/2010 às 18:07

    Você colocou com muita propriedade, Zé Luiz. Depois que o STF derrogou a Lei de Imprensa, considerando que ela não foi recepcionada pela Constituição de 1988, os meios de comunicação são o único setor da sociedade sem qualquer regulação. Isso é inadmissível em um Estado Democrático de Direito.

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