Archive for 19/11/2010

“OS PRECONCEITOS, MEU AMIGO, SÃO OS REIS DO VULGO.” (Voltaire).

Assisti estarrecido o vídeo postado no blog Unaí Para Todos, em que o jornalista Luiz Carlos Prates, da RBS de Santa Catarina, ao discorrer sobre o balanço do trânsito no último feriado, tece comentários preconceituosos sobre os pobres que agora, graças ao crédito fácil promovido pelo “espúrio” Governo Lula, têm o direito de comprar carros sem nunca terem lido um livro sequer. (Para quem não viu o vídeo, disponibilizo-o ao final deste artigo).

De início, não acreditei no que via: a mais solene e clara manifestação preconceituosa que ouvi nos últimos dias, que chega às casas dos cidadãos através de uma rede de televisão, que é uma concessão pública, ou seja, um bem de toda a sociedade.

Desde a última eleição, esse tipo de comentário brota aqui e ali: Mayara Petruso, no Twitter, incitando a violência contra nordestinos; a descoberta de núcleo nazifacista em Porto Alegre; e jovens de classe média agredindo pessoas por motivos homofóbicos.

Antes se dizia que não éramos um país preconceituoso, mas hoje se descobre, graças à grande mobilidade social ocorrida nos últimos anos, que a discriminação, especialmente a de classe, sempre esteve latente entre nós, escondida nos subterrâneos, e não aflorava porque a classe dominante não se sentia realmente ameaçada.

As infelizes declarações do jornalista não deveriam merecer, por si só, tanta tinta. Mas não posso deixar de notar que os acidentes de trânsito, na sua tosca visão, são provocados pelos pobres que agora têm carros. Deduzo, portanto, que rico não se envolve em acidentes de trânsito e respeita fervorosamente a legislação, inclusive porque tem o saudável hábito da leitura.

Daí porque as causas da violência no trânsito no Brasil decorrem do fato de as pessoas de baixa renda comprarem carro, sobretudo carros populares. Você, que não é rico, e que comprou um carro 1.0 ou equivalente nos últimos anos, é o grande vilão das estatísticas.

A julgar pelas manifestações do tal Luiz Carlos Prates, o caos do trânsito brasileiro se deve a essa inclusão social. Resolve-se, então, o problema simplesmente impedindo que pobres iletrados comprem carro. Que andem a pé, de ônibus, de bicicleta, de charrete, mas não de carro. É simples assim.

Também me chamou a atenção o adjetivo dado ao atual governo, chamado de espúrio (ou seja, não genuíno, ilegítimo, falso) justamente por dar aos menos favorecidos as mesmas oportunidades que este país sempre conferiu à sua elite. Um governo que inclui os cidadãos, que lhes dá acesso a bens de consumo, a serviços públicos essenciais, como energia elétrica, à possibilidade de acesso à educação através de instrumentos como PROUNI e ENEM e a emprego e renda é epitetado como um governo adulterado.

E é adulterado, segundo esse distorcido ponto de vista, porque vai na contramão de todos os governos que tivemos até então, que não se preocuparam em garantir ao brasileiro o acesso pleno aos direitos que a cidadania lhes confere. É um governo ilegítimo por contrariar os interesses dos ricos, dos poderosos, da elite dominante, da Casa Grande, fazendo ascender a Senzala.

Por último, devemos refletir que o referido “jornalista”, para expressar a sua opinião discriminatória, se valeu de uma concessão pública, ou seja, de um serviço pertencente à sociedade brasileira. Foi por meio da televisão que destilou o seu ódio, não se preocupando com o interesse social e com o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, que os meios de comunicação estão obrigados a proteger e a cultivar.

E quando alguém fala em regulamentar os arts. 221 e 222 da Constituição da República, através da chamada “Ley de Medios”, a imprensa deita e rola, acusando o governo de solapar a liberdade de expressão, como se a mídia pairasse sobre o bem e o mal, sobre tudo e sobre todos, livre de qualquer regulação legal que a impeça ou a inibia da prática de atos flagrantemente contrários aos interesses da coletividade.

Lastimável. Terrível. Lamentável. Hororroso. Sem resvalar também em algum tipo de preconceito, encerro constatando que a região sul, especialmente os Estados de Santa Catarina e Paraná, se notabiliza pelo domínio político da direita brasileira. São estados conservadores em que grande parte da população tem tendência à discriminação em todos os matizes. É campo fértil para o crescimento do ódio e do preconceito.

E já que o título deste artigo é uma citação, fecho com outra: “Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito.” (Albert Einstein).


19/11/2010 at 7:28 7 comentários


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